quarta-feira, 29 de agosto de 2012

JESUS e ou ISAÍAS – Depoimento de Jesus Miranda Prado PARTE II





Bom, pessoal, quando fiz o primeiro depoimento, jamais poderia imaginar que acontecesse o que vou relatar.

Anteontem, mais precisamente no dia 25 de agosto de 2012, data em que Barretos comemora aniversário, quem ganhou o presente fui eu – e que presente, meus amigos!

Por volta das 17 horas, o telefone de casa tocou, e eu despretensiosamente, o atendi de maneira natural. Do outro lado da linha, uma pessoa falante e muito simpática me disse: “Boa tarde, aqui quem fala é a Rachel e aí quem está falando?” Respondi: “É o Jesus, Boa tarde”.  Pensei com meus botões: “Lá vem telemarketing”, mas não, a pessoa calmamente começou a me explicar do que se tratava.

Sabe, Sr. Jesus, minha filha estava fazendo uma pesquisa na internet, no Google, e ao digitar JESUS APARECIDO MIRANDA DO PRADO, localizou o Blog dos Ex-Moradores do Frigorífico (http://frigorificobarretos.blogspot.com.br/2012/07/jesus-e-ou-isaias-depoimento-de-jesus.html) e pelo seu depoimento, acho que o Sr. é irmão do meu marido, o LUIZ CARLOS SOARES. (Eu já sabia que tinha um irmão, pois minha mãe adotiva já havia me dito. Também no ano de 1960, quando eu tinha 4 anos de idade, por ocasião do falecimento de meu pai adotivo, Sr. Roque Lucio de Godoy, lembro-me que estiveram em minha casa, uns dias depois, uma senhora juntamente com uma criança. Tratava-se de minha mãe biológica, Sebastiana Miranda do Prado e meu irmão, Luiz Carlos Soares. Depois dessa data, nunca mais os vi nem obtive notícias deles).
Voltando ao telefonema... Acho que mudei de cor.  Do outro lado, a Rachel contando e, deste lado, eu apenas respondendo: hum.... sei.... hum... hã hã – e na minha frente, minha esposa.... “que foi bem, o que está acontecendo? E eu continuei: sim.... hã hã... – minha mulher novamente perguntou: “O que está acontecendo?. (Isso porque nossos dois filhos não estavam em casa – mas em plena festa do Peão de Boiadeiro, então ela ficou preocupadíssima – achando que pudesse ter acontecido algo). Lembro-me que tapei o telefone e sussurrei: “É da parte do meu irmão – é a esposa dele”. Nisso, a Rachel tinha me dito que a filha dela, Gabriela (minha sobrinha), havia pedido para ser adicionada em meu Facebook e no campo destinado a escrever mensagens, ela escreveu um resumo de tudo aquilo que tínhamos acabado de conversar. Desligamos o telefone, eu ainda sob forte emoção e comoção, entrei na minha página e lá encontrei a mensagem escrita por minha sobrinha. Respondi às indagações que me foram feitas e pouco tempo depois, a Gabriela me chamou inbox e começamos a nos falar e a aparar as arestas dessa história...
Logo depois, a minha cunhada Rachel disse que o Luiz (meu irmão) iria me ligar para conversarmos. Lembro-me que o Luiz estava muito emocionado – muitas vezes percebia sua voz embargada. Confesso que tive que me desdobrar para poder dar prosseguimento ao nosso diálogo... O coração a mil, mas aguentei firme. Falamos que devíamos nos ver e ele me disse que nunca desistiu de me encontrar, como de fato foi ele quem me achou, graças ao mundo virtual e à sua filha Gabriela.
Bom, por ora, o que tenho a dizer é que vamos nos programar para um encontro e se Deus quiser será num futuro bem próximo, para podermos nos abraçar e conhecermos os demais membros da família.
Graças a Armínia Barbosa que me encorajou a escrever o primeiro depoimento no Blog (Jesus e ou Isaias), pude ser contemplado com esse presente de Deus. Faço também um agradecimento especial à Rossana Pacheco que me incentivou a escrever a parte II do depoimento.

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Augusto Guedes




Augusto Guedes

           Um item não bem estudado na pecuária do Brasil Central foi a do comprador  de gado para o abate. Os negociantes ao vivo dos abatedores, principalmente  dos grandes frigoríficos (Anglo, Armour, Swift, Wilson) eram especialistas, geralmente nacionais, que conheciam todos os fazendeiros que "invernavam" o    boi  e antes da safra começavam a abordá-los.  
          Um desses compradores foi Augusto Guedes de Oliveira, que trabalhava  para a  Anglo  e disputava o campo, por exemplo, com Antônio de Paula, que comprava para a Armour e depois para a Swift: eram rivais nas operações de boca, mas amigos nos bate-papos pelos bancos do jardim da Praça da Matriz. Augusto Guedes trabalhou na Anglo durante 46 anos e morreu em 1970, com 76 anos de idade.
          Era natural  natural de Jaguareiva,  Estado do Paraná, na divisa do Estado com o de Santa Catarina, filho de  Teófilo  Guedes e de Senhorinha Guedes e nasceu no dia 24 de setembro de 1893.
            Por volta de 1925 o Frigorífico convidou Augusto para ser o responsável pelo setor de compra de gado da empresa. Residiu por um tempo no  Club House, até se casar em 31 de dezembro de 1927 com dona  Alcídia Prudente Oliveira Guedes. Filhos do casal:

  1. Paulo Augusto Guedes, falecido em 1994, era casado com Yeda Romanello Guedes. Filhos:   Patrícia Romanello Guedes Werthemier, casada com Roberto Werthemier (pais de Guilherme e Gustavo)  e Augusto Guedes Oliveira Neto, pais de  Tiago, Caio, Mourine de João Augusto).  
  1. Rodolpho  Augusto Guedes, falecido com um ano e meio.
  1. Ana Rosa Guedes Prado, casada com Nilson Ferraz Prado. Filhos: Ana Elizabeth Guedes Prado,  casada com José Marcio Sanches (pais de: Roberta, Rafael, Maria Eduarda);  Fernando  Augusto Guedes Prado, casado com Raquel; Gustavo Henrique  Guedes Prado, engenheiro.
  2. Sanita Guedes, falecida. Formou-se em Desenho pela Faculdade de Belas Artes de São Paulo. Exerceu por muitos anos o cargo de professora em Barretos e nas cidades da região.Sanita contava que o seu nome foi dado por seu pai em homenagem a uma antiga namorada que  Augusto teve em sua terra natal. Quando o pai levou Sanita para conhecer a terra deles, ele disse para a menina: aqui morava sua chara Sanita. 
  1. Carlos Otávio Guedes, falecido solteiro, com trinta anos, trabalhou no Frigorífico.
  1. Marlene Guedes Assunção Sen, foi casada com  Pércio Piratininga Assumpção Sen.  Filhos: Renata Guedes Assumpção Queiroz, casada com Romeu Queiroz, engenheiro, residem em São Paulo (pais de Mariana e Carolina, falecida)  e Andréa Guedes Assumpção Sen, mãe de  Thaís.  

            Durante  46 anos  Augusto Guedes foi comprador oficial de bois para o Frigorífico Anglo, tendo se destacado como uma das mais importantes figuras  do quadro de funcionários  da empresa. 


Informações cedidas por Sanita Gudes (in memorian)


           

terça-feira, 24 de julho de 2012

Jesus e ou Isaias - depoimento de Jesus Miranda do Prado


Pessoal, há alguns dias, em conversa imbox com a Arminia Barbosa, contei a ela uma história a meu respeito e ela me perguntou se eu teria algum preconceito e contar aqui no grupo. A princípio achei que fosse algo da vontade de minha mãe (adotiva) e que não iria me expor. Confesso que fiquei com isso martelando em minha memória por vários dias e hoje resolvi contar essa passagem.

Era uma vez: No dia 17 de dezembro de 1957, eu com 1 ano e 4 meses de idade, fui adotado por Roque Lúcio de Godoy e Maria Gesuina dos Santos Godoy, na cidade onde nasci - IBITINGA-SP.  e alguns meses depois meus pais adotivos mudaram-se para a cidade de ITÁPOLIS, também interior de São Paulo. 

Já com a idade de 4 anos, meu pai adotivo (Roque) faleceu. Minha mãe então teve que trabalhar de doméstica para me criar. Para não me deixar sozinho, me colocou em uma creche, onde fiquei até meus 6 anos. Recebi até um diploma desta escolinha onde conferia a mim "ISAÍAS LÚCIO DE GODOY" a conclusão do Curso Maternal. (Tenho esse diploma até os dias de hoje).

Aos 8 anos de idade minha mãe adotiva (viúva há algum tempo), casou-se pelo segunda vez com o então morador do Frigorífico  Anglo, Sr. Augusto Andrade Leite e mudamos para o Bairro, na cidade de Barretos-SP. Nossa vizinha na época - D. LAURA PASSARELLI, certo dia chegou pra minha mãe e perguntou:  "- D. Maria o Isaías não vai pra escola estudar? As aulas já começaram há mais de 15 dias e eu o vejo em casa todos os dias".
 Minha mãe respondeu: "-Ele não que ir, disse que não gosta de estudar". Lembro que a D. Laura passou um "pito" na minha mãe e disse: "- D. Maria, criança não tem o que querer, tem de ir pra escola e pronto. Me dê o registro de nascimento dele, que eu mesma irei matriculá-lo no Grupo Escolar". E isso foi feito.

Meu primeiro dia de aula lembro-me que a professora era D. Geni, mas nesse meu primeiro dia, ela havia faltado e quem a substituiu foi o professor Oto. Alguém se lembra da figura?  

 Pois então. Terminada a chamada, o professor perguntou se dentre os presentes havia alguém que não fora chamado. Eu me levantei (aliás o único da classe que se levantou) e disse que não tinha sido chamado. Então ele me perguntou: "- Qual o seu nome?". 
Eu respondi:  " - Isaías professor". - Mas Isaías de quê - indagou o professor. Eu logo mandei: " - ISAÍAS LÚCIO DE GODOY". 

"- Bom,  então vamos na secretaria pra ver o que houve. - Da secretaria fomos parar na Diretoria. Imaginem, primeiro dia de aula e eu já fui parar na Diretoria, justo com quem? Com o temido Diretor EGÍDIO DA SILVA. Fui então pra casa chamar minha mãe, a qual veio acompanhada da D. Laura (a que fez minha matrícula). E para minha surpresa, nesse dia descobri que no registro civil meu nome é JESUS APARECIDO MIRANDA DO PRADO.  Meus pais que me adotaram (Roque e Maria)  queriam mudar meu nome para Isaías, mas não foram ao Cartório. Coisas de antigamente.

terça-feira, 17 de julho de 2012

DEPOIMENTO DE NOEMIAS CAMARGO

 Meu pai, Nelson Camargo, era conhecido por todos como Japão. Ele era irmão do Odair, conhecido por Dico. Era muito amigo do Moela, do Carrapicho, do Gilberto, do Antônio e do Morgado.
Ele trabalhava nas forjas como ferreiro. Seu chefe era o Armandão. Minha mãe, dona Nair, era pequenina no tamanho, mas grande em bondade e força. Ela teve sete filhos: Neila, Neide, Neusa, Nelson Junior, Norma e eu,  sendo que uma morreu quando era nenê.
Morávamos na avenida Paulista. Interessante, não me lembro do número da casa, mas éramos vizinhos da dona Cidu e de dona Sebastiana.
Éramos crianças muito felizes. Nascemos todas em uma casa da Colônia dos Operários. Nossa casa era nosso castelo. Percorríamos descalços o Campo de Golfe, a área dos ingleses e nos sentíamos muitos felizes.
Não conheci meu avô, pai de meu pai. Sei que ele trabalhou no Frigorífico, puxando lenha com carroça.
Vou contar uma história acontecida no Frigó. Eu tinha uns nove anos, quando o Mauro, filho da dona Chica, chegou em casa e pediu para minha mãe deixar eu ir com ele até a farmácia buscar o remédio da mãe dele.
         Minha mãe deixou. Fomos eu, o Nelsinho e o Mauro buscar o remédio a pé. Parecia que era longe. Ao retornar em casa, minha mãe perguntou: “Mauro, cadê o remédio de sua mãe?” Ele respondeu: “Ah, joguei fora.” Minha mãe, brava, mandou que voltássemos e o pegássemos de volta.
         Ocorre que os comprimidos (gardenal) eram de drágeas coloridas, parecidas com uns confetes comestíveis que tinham lançado. Como tinham um sabor docinho, Mauro comeu quase tudo no caminho.
         Quando passamos a primeira porteira do Frigó, próximo da entrada para a Colônia dos Ingleses, vi a dona Chica correndo atrás e dizendo: “Mauro, cadê meu remédio?!” O Mauro corria alguns passos e caía e, quando sua mãe chegava perto, ele se levantava.
         O remédio fez efeito e ele teve de ser levado à Santa Casa para fazer lavagem. Nossa! Foi um susto danado, mas terminou bem. Não esqueço nunca disso...
         Mudei do Frigó em 11 de janeiro de 1973. Tinha 13 anos. Viajamos a noite inteira de trem. Chegamos cedo em Campinas. Quando voltei a Barretos e vi a Colônia destruída, bateu uma saudade danada. As lembranças das caminhadas até o grupo, à igreja, ao restaurante. Nossa, se pudesse voltar no tempo...
Que saudade do Barro Branco! Esse local ficava perto dos Arno, íamos à pé,  as vezes,  pela linha do trem sentido estação. Os barrancos realmente eram brancos, ou seja, barro branco mesmo, tipo argila e, no local em que todo mundo nadava, o rio era bem largo.
Eu também jogava pingue-pongue no clube. Muita saudade! Os operários ocupavam as casas conforme o cargo que exerciam na fábrica; alguns moravam na Campinas, outros na Paulista.; outros na avenida Central, mas nós, crianças, não percebíamos nada disso. Vivíamos nossa infância feliz.



Diploma de Noemias Camargo, na escola Fábio Junqueira Franco


sexta-feira, 13 de julho de 2012

DEPOIMENTO DE LEOPOLDO COSTA


Escritório em São Paulo

Minha família é de origem mineira. Meu pai era pintor sacro (pintou vários painéis de fundo religioso em muitas igrejas do interior de Minas Gerais) e, para sustentar a família (pois arte não dá dinheiro), trabalhava como pedreiro.
No final da década de 1950, conversando com o meu tio e minha tia que moravam em Barretos, e buscando melhor condição de vida para a família, surgiu a ideia de meu pai vir para Barretos, onde se empregou no Frigorifico Anglo, como encarregado da turma de pedreiros que trabalhava nas colônias. Depois de alguns meses, conseguiu uma casa na colônia, na avenida São Paulo, e foi buscar a família em Minas. Eram sete filhos e o mais velho, eu, tinha pouco mais de 12 anos.
Infelizmente, meu pai adoeceu e morreu prematuramente aos 43 anos de idade, no dia 3 de outubro de 1961, deixando minha mãe viúva com uma penca de filhos pequenos para criar. D. Conceição, minha mãe, foi uma lutadora e priorizou a família. Viúva, bonita, com 36 anos de idade, recebeu propostas de casamento, mas para proteger os filhos, não aceitou.
 Todos os filhos completaram o curso superior, menos o Antonio, que fez outra opção. A família, após a morte de meu pai, recebeu muito apoio dos vizinhos, principalmente dos que moravam no mesmo bloco da colônia, como D. Palmyra e Sr. Luizão, moradores da casa contígua.

Fotografia constante na minha carteira profissional (era menor de idade).

Eu, com 15,  e minha irmã, com 14 anos, nos empregamos na fábrica. O salário de um funcionário menor de idade era a metade do salário mínimo e tanto eu quanto minha irmã usávamos este dinheiro para complementar a pensão de viúva que minha mãe passou a receber para o nosso sustento. Minha irmã foi trabalhar na seção de vendas e eu fui limpar o chão com vassourão na Descarneação (Desossa). O chefe era o Chimango e me recordo do Sr. Costa, pai da Zainha, do Roda e da Cristina, que trabalhava como desossador e me dava apoio. Depois, quando começou o abate de aves, fui transferido para a seção e, com outro rapaz (Ozéas), transportava as aves em um gaiolão do galinheiro para a sala de abate, próxima à sala de matança de bois. O chefe da Matança de Aves era o Sr. Nephtaly Bittencourt. Como eu estudava e era habilidoso na escrita, fazia para ele o relatório de produção e rendimento. Então, quando precisaram de um estoquista, fui transferido para a seção de Conservas, cujo chefe era o Sr. Antônio Batista. Foi nesse departamento que conheci a minha esposa Adeci. Certo dia, o Sr. Batista disse-me que o gerente Sr. Bartlett queria falar comigo. Fiquei assustado, mas ele me tranquilizou, dizendo que era notícia boa. Apresentei-me na Gerência e a conversa resultou em um convite para trabalhar como calculista no Departamento de Custos, cujo chefe era o Sr. Bardoe. Nesse período, casei-me e fui morar na Av. Campinas, quase no final, sendo vizinho do Sr. Leão; mas logo depois mudei para a Av. São Paulo, na casa vizinha à do Sr. Inácio e D. Sonia.
Destaquei-me no departamento de Custos e, por conseguinte, fui convocado para instalar o controle de estoques e de custos no frigorífico de Goiânia, o qual havia recentemente sido inaugurado. O sr. Bardoe (chefe do Departamento) se aposentou e então contrataram um argentino de ascendência britânica para substituí-lo. Infelizmente, o novo encarregado não se deu bem, ocorreram alguns problemas e precisou vir de Londres um especialista para resolver a situação. Nessa época, o gerente da fábrica era o Sr.Cunnigham e ele decidiu que o chefe recém-contratado fosse dispensado, nomeando-me para a chefia, onde fiquei vários anos.
Mudei-me então para a Av. Central, na casa onde havia morado o Sr. Nephtaly (ficava entre a do Neno-Sinhá e do Sabiá-Direce). Logo depois, mudei-me para a colônia dos ingleses, na Av. Federal. Minha casa era a primeira à direita, vizinha da residência do Joaquim Sola, confrontando com as casas da Av. Central onde moravam o Sr. Diamantino e o Sr. Mário Pereira. Minha secretária no departamento de Custos era a Rosane (filha do Epifânio) e faziam parte da minha equipe: Ali Salomão, Luis Borges, Hélio Perazolli, Carlos Foresto e muitos outros como Roberto Pereira, Ivan Kandratavius, José Valeretto, Celso Valeretto, Eli Daniel, etc.
Tempos depois, vagou o cargo de Diretor Geral de Produção e Custos em São Paulo e fui escolhido por Londres e pela Presidência para ocupá-lo. Para preparar-me, mudei-me  com a família para a Austrália, onde fiquei durante um ano em treinamento em três frigoríficos, como também no Escritório Central de Sydney.
(Sydney. Austrália)  Meus filhos voltando da escola no período em que moramos lá.

Assim,aprendi muito e pude melhorar o meu inglês. Voltei ao Brasil e assumi o cargo de Diretor, pela primeira vez ocupado por um brasileiro, pois desde a fundação da Anglo, tal cargo era exercido apenas por britânicos. Fui diretor durante 14 anos, participando da tomada de importantes decisões, como a construção do Frigorífico de Gurupi e a compra do Frigorífico Atlas. Mais tarde, acumulei também a função de atuar no gerenciamento das vendas nos mercados interno e de exportação. Dentre outros, participaram da minha equipe: Michael Nunn, Dominic McDermott, Mark Duffen, José Rodriges (Zé do Peixe), Álvaro Mesquita e John Hunter.
Eu viajava anualmente para Londres para discutir orçamentos e resultados e visitava as filiais de vendas dos grupos de Hamburgo, Rotterdam, Genova, Barcelona, Zug (Suíça) e outras. Na negocição de grandes contratos, como a venda de carne para Israel, Irã e Iraque, visitei, também,  estes países.
Comecei trabalhando em São Paulo, no escritório da rua Anchieta, (próximo da Praça da Sé). Depois, o escritório mudou-se para a rua Campo Verde (esquina da av. Faria Lima), posteriormente para prédio próprio na rua Felipe dos Santos (na Liberdade-São Joaquim) e, finalmente, para a rua Afonso Brás (Vila Nova Conceição). Comecei na Anglo como varredor do chão da descarneação, aposentei-me como Diretor e me orgulho disso.



quinta-feira, 12 de julho de 2012

ANÚNCIOS E LOGOTIPOS

Anuncio de ofertas do Mini-Mercado da Anglo do Frigorifico 1984, acervo Leopoldo Costa

Logo da Anglo na década de 1970-1980, acervo Leopoldo Costa

POESIAS - IDEVAL FERREIRA



Pintura de José Luiz Sacheto



UM CERTO LUGAR


HÁ UM CERTO TEMPO
HAVIA UM LUGAR
QUE NÃO ERA O CÉU
MAS ESTAVA BEM PERTINHO DELE
O NOME DESSE LUGAR?
FRIGORÍFICO ANGLO, CARINHOSAMENTE CONHECIDO COMO FRIGÓ.


LÁ, ENCONTRAVAM-SE PESSOAS
CUJAS VIDAS ERAM VIVIDAS,
SONHOS ERAM SONHADOS...
FRUSTAÇÕES, INCOMPREENSÕES
TRISTEZAS, ALEGRIAS...
TAMBÉM OCORRIAM

LEMBRANÇAS INCRUSTADAS
NAS MEMBRANAS DA VISTA
JAMAIS SERÃO APAGADAS
POIS OS CORAÇÕES AS ETERNIZARAM

AGORA OS SENTIMENTOS VÊM À TONA
NUM TURBILHÃO DE EMOÇÕES
SAUDADES....
ETERNAS SAUDADES...


AQUI ESTAMOS NÓS CONTINUANDO A VIDA
ESSA VIDA ABENÇOADA
ENTRETANTO, FURTIVAS LÁGRIMAS
CAEM SILENCIOSAS
NO CANTO DOS OLHOS

SUSPIROS, GEMIDOS
MAS, MAIS, MUITO MAIS
SATISFAÇÃO DE VIVER
E DE SABER
QUE ESTAMOS COM DEUS,
GUARDADOS POR ELE.

CONTINUAMOS...
SIM, VAMOS EM FRENTE,
NÃO SÓ OLHANDO PARA TRÁS
COM NOSSOS OLHOS FITOS
NO QUE SE PASSOU
MAS CERTOS DE QUE AVANTE
VEM O TRIUNFO, VEM A VIDA

NOSSO PAI TEM UMA PROPOSTA DE VIDA
VIDA QUE SEGUE, DE LUTAS, SIM
DE LUTAS, PROVAÇÕES, SACRIFÍCIOS
MAS.... VIDA COM DEUS!






MULHER CRISTÃ

CORAÇÃO FORTE, VIBRANTE, ENVOLVENTE
QUE NOS EMBALA, NOS ANIMA, NOS RECEBE
AUXILIADORA IDÔNEA QUE ENFRENTA, 
JUNTO A SEU CÔNJUGE E  FILHOS,
AS LUTAS DIÁRIAS.

EXPLODE NA EMOÇÃO DO SERVIÇO DO SENHOR
ABRAÇANDO SEMPRE FIRME O ESCUDO DA FÉ
NUMA CONSAGRAÇÃO CONSCIENTE E AMOROSA
FAZENDO DE CADA ATO SEU
UMA EXPRESSÃO DE VERDADEIRA ADORAÇÃO.

MULHER CRISTÃ,
SEU NOME ESTÁ ESCRITO
NAS PÁGINAS DO LIVRO DA VIDA
MAS TAMBÉM INCRUSTADO INDELEVELMENTE
EM NOSSOS CORAÇÕES.

A GRATIDÃO DE ESPOSOS, FILHOS, IRMÃOS
TORNA-SE ÍNFIMA DIANTE DE TUDO QUE FAZES
PARA PROPAGAR O REINO DE DEUS
NUM MUNDO SOFRIDO, CARENTE DA GRAÇA,
DO AMOR E DA ENTREGA A JESUS.

NA HARMONIA E BELEZA DA NATUREZA MÃE
CURVADOS ANTE O SENHOR DA VIDA
IMPLORAMOS A BÊNÇÃO DO PAI
EM FAVOR DO SEU SERVIÇO, BONDADE,
VIDA E DEDICAÇÃO EM AMOR!

IDEVAL FERREIRA DA COSTA

(Acordei hoje desejando oferecer uma homenagem às mulheres...)

Depoimento de Jesus Miranda Prado




Nasci em Ibitinga-SP e quando tinha 4 anos de idade, meu pai faleceu. Fomos então morar na cidade de Campinas-SP e, aos 8 anos de idade, cheguei em Barretos, em 23 de maio de 1963, data em que minha mãe (viúva há algum tempo) se casou com o então morador do Frigorífico (meu padrasto), Sr. Augusto Andrade Leite, mais conhecido por "Tio Gusto".
Em Barretos, moramos primeiramente na Vendinha (por 10 meses) e, depois, nos mudamos para a Avenida Paulista, número 400, do bairro Frigorífico, onde ficamos até 10 de junho de 1970.
Na área Educacional, no período em que morei no bairro, entrei aos 8 anos no Grupo Escolar "Fábio Junqueira Franco", onde estudei até o 4º ano primário. Depois fiz o curso de Admissão na Vila Pereira. Em seguida, fui aprovado para o curso ginasial nessa mesma escola, mas com a denominação de Ginásio Estadual "Benedito Realindo Correa" (conhecido por GEBREC).  Estudei nesse colégio até o 2º ano ginasial. Então me mudei para Barretos e fui estudar na Escola Estadual de Primeiro e Segundo Grau “Professora Paulina Nunes de Morais".
Comecei a trabalhar aos 10 anos de idade, primeiramente, como engraxate, acumulando, em alguns momentos, a tarefa de ser carregador no Campo de Golfe - isso até meus 13 anos de idade. Depois trabalhei como jardineiro na casa do Mr. Brian (onde fiquei 3 meses) e, em seguida, fui trabalhar na Casa do Sr. Diamantino Malho (também por 3 meses).
 Fui Sócio de meu primo Luis Carlos Vasco (Carlim China) em uma das hortas existentes no bairro, onde plantávamos para vender: alface, almeirão, cenoura, couve, cebolinha, repolho, mas a parceria não vingou e acabei por deixar meu primo sozinho no negócio.
 Completei 14 anos de idade e pude, assim, tirar minha Carteira de Trabalho (por sinal, já a postei no grupo “Frigorífico e seus moradores”) e trabalhar registrado na Cooperativa de Consumo do Frigorífico de Barretos, por um período de 3 anos.
 O meu padrasto trabalhou na Anglo por 44 anos (aliás, foi seu único emprego), saindo do bairro pra morar em Barretos, já aposentado. Em Barretos, terminei meus estudos e obtive o título de Bacharel em Administração de Empresas, graduado na FAER, em São José do Rio Preto-SP.
 Este é o resumo de minha passagem pelo Bairro Industrial do Frigorífico, do qual tenho a honra de ter sido morador e ter feito parte de sua história, além de ser grato por ter tido as oportunidades relatadas acima.

QUE DEUS SEJA PRESENTE EM NOSSOS LARES!

quarta-feira, 11 de julho de 2012

Família Sarri


Da Itália ao Brasil: Chegada da Família Sarri
Escrito por Lucas Bonatelli Malho, relato de Maria Aparecida Sarri Bonatelli

Giovana Lunardelli (no Brasil ficou Joana)  e Domingos Sarri

Deixando para trás a Itália, sua história, amigos, vizinhos, familiares e momentos, para enfrentar a longa e dura viagem de navio ao cruzar o Atlântico, a Família Sarri embarca em Treviso, uma província da região de Veneto, na Itália, além-mar, rumo à "Terra de Vera Cruz".
Sua chegada ao Brasil ocorreu por volta de 1914, no Porto de Santos, estado de São Paulo. A Família era composta pelo patriarca Domingos Sarri e pela matriarca Joana Lunardelli, além de seus filhos: Primo Sarri (nome escolhido por ser o primeiro filho do casal), Guido Sarri, Sérgio Sarri, Carméla Sarri e Tizira Sarri.
A família italiana começou sua longa e marcante jornada no Brasil tão logo aqui chegou. De Santos, eles foram remanejados para trabalhar na lavoura no município de Nuporanga. Assim, já no Brasil, o casal teve mais cinco filhos: Alfredo Sarri ou Tio Ben (Sua mãe dizia que o teve no navio, vindo a ser registrado no Brasil), Hermantino Sarri (Tio Nego), Julio Sarri, Ida Sarri e Edis Sarri. Depois de trabalharem em Nuporanga, mudaram-se para a Fazenda da Serra (Andes - entre Colina e Bebedouro), a fim de também lidar com a lavoura. Continuando ainda na vida dura e difícil do Brasil Rural, mudaram-se para Guaraçai -  noroeste do estado de São Paulo, para também tirar o sustento da família da terra. Nessa fazenda, as casas não possuíam portas nem janelas e se escutavam, na calada da noite, ( nem tão calada) em meio a mata fechada ,os uivos das onças, que os deixavam arrepiados.
Com o pouco dinheiro guardado do trabalho de todos no campo, foi possível realizar um pequeno investimento em um restaurante que estava sendo vendido no Frigorífico Anglo, no município de Barretos. Assim, num fluxo que viria a ser fundamental na estrutura econômica brasileira, realizaram seu pequeno êxodo rural e se mudaram para Barretos, fixando-se no Frigorifico Anglo, em 1945, ano em que, num contexto maior, foi marcado pelo triste período da Segunda Guerra Mundial a qual, por incrível que pareça, viria a influenciar no cotidiano da pequena comunidade do Frigorífico. As filas para se conseguir farinha, açúcar e alimentos eram eternas e, dessa forma, os proprietários do único armazém ficavam à mercê da Guerra, sem ter condições de fazer algo para os moradores.

A Grande Família
Quando chegaram ao Frigorifico e se fixaram no restaurante, ocorreu o primeiro desafio: Como conviver naquele local, com uma família formada por 20 pessoas?!
Na casa que existia atrás do restaurante havia quatro quartos, sala, cozinha e um banheiro. Para acolher melhor toda a família, foram construídos mais quatro quartos, porém o único banheiro gerou, por muitos anos, longas filas e batidas na porta. Todavia, um banheiro com banheira e água quente era motivo suficiente para que todos demorassem no banho.

Árduo Trabalho
O Restaurante - Armazém - Bar - Padaria da Família tinha uma função importante no Frigorífico, pois era responsável por alimentar os trabalhadores da Anglo e moradores do local. Sendo assim, toda a família trabalhava no negócio para melhor atender os fiéis fregueses e amigos. Às três e meia da manhã estavam de pé para começar a limpeza e preparar o café da manhã para os trabalhadores, pois o trenzinho que vinha de Barretos chegava às seis horas da manhã com os operários da Anglo. O cheiro do café exalava pelo restaurante e, pingado no leite, era acompanhado por um delicioso pãozinho quente com manteiga, feito no próprio restaurante. Serviam café para mais ou menos 30 a 40 trabalhadores todos os dias e terminar de servi-lo significava que o trabalho estava apenas começando, já que o almoço teria de estar pronto até as onze da manhã.

Família Sarri, Joanna (Giovana) e Domingos, filhos, genros e noras. Foto de Carla Patricia Sarri 

Dona Maria Cozinheira e suas ajudantes faziam um delicioso arroz, feijão, salada e bife acebolado – comida tipicamente tradicional nas mesas brasileiras. Quando parecia que o dia estava acabando, iam novamente pegar no batente, pois a janta era servida entre seis e oito da noite, sempre regada de uma bela panelada de sopa. E, finalmente, encerravam o dia de batente no restaurante. Árduo serviço que toda a família,  com muita felicidade, contribuía para o negócio prosperar.  Salário não conheciam, pois como a estrutura de trabalho era familiar, utilizavam o dinheiro de acordo com o surgimento de necessidades. “Roupas e sapatos eram raros, pois lembro-me de ter usado vestidos de saco de farinha, para economizar o pouco dinheiro que tínhamos”, relata Aparecida Sarri Bonatelli. Claro que isso gerava risadas de alguns moradores, já que não era comum costurar vestidos em sacos de farinha. Mas sabiam que esbanjar não estava em suas prioridades naquele momento.



Restaurante Sarri 


             Joana Lunardelli e Domingos Sarri

         Primo Sarri e Madalena Batista de Souza
         Guido Sarri e Maria Aparecida Paschoaleto
         Sérgio Sarri e Maria Pires Santana
         Carméla Sarri e J oão
         Tizira Sarri e Zacarias Pires Santana
         Alfredo Sarri e Alice Pires Santana
         Hermantino Sarri e Julieta Betini
         Julio Sarri e Ana Coltri
         Ida Sarri e Domingos Mateus Martins
         Edis Sarri e Odete Vinhotis



Da esquerda para a direita: Maria de Lucente, Tenente e Cidinha Bonatelli, filha de Primo Sarri. Cidinha casou-se com Wilson Bonatelli, filho de Mario Bonatelli e Brasilina.  Foto de 1955. 






OS INGLESES NO FRIGORÍFICO

                                                                                                             Por Leopoldo Costa
                                                                                                                Março de 2012



Londres. 1931. John era filho de açougueiro e sempre acompanhava o pai para comprar carne em Smithfield quando ficou sabendo da possibilidade de deixar a Inglaterra para trabalhar no Brasil e abandonar o vício de beber exageradamente (promessa feita a mãe). Era um alcoólatra contumaz e passava as noites nos pubs. Ingrid, filha de um pastor, mesmo depois de casada trabalhava em uma padaria. O casal com menos de um ano de casado, ainda não tinha filhos. John e Ingrid tinham a mesma idade: 24 anos. Contratado pelos Vesteys receberia um salário mensal cerca de três vezes superior o que ganhava em Londres, a viagem de ida para o Brasil de navio com todos os seus pertences, férias de três em três anos na Inglaterra com passagem de ida e volta para ele e família, moradia e outras regalias. Seria a primeira vez que ambos saíram da Inglaterra.
Os navios eram do Grupo, da Blue Star Line, geralmente mistos de carga e passageiros e levava entre dois e três meses de viagem, dependendo da rota da embarcação e a demora nos portos.
O casal chegou a Santos sabendo poucas palavras em português, sendo recepcionado pelo pessoal do escritório da Blue Star Line e encaminhado a São Paulo para ser entrevistadopor um diretore receber algumas orientações. Acostumados em Londres assustaram com a cidade. No outro dia, tomaram o trem noturno da Paulista e chegaram a Barretos onde foram levados para ocupar a moradia a eles destinada. Casa ampla com três dormitórios, sala, copa, cozinha, despensa, banheiros e varanda.  Muito mais confortável do que o flat que moravam num subúrbio de Londres. Ficaram alguns dias envolvidos na montagem da casa. Ingrid estava feliz por que John não estava bebendo, mas, já com muitas saudades da família.
Barretos era uma cidade pequena e provinciana. De modo geral toda a população vivia em torno da atividade do frigorifico e das lavouras de milho, algodão e arroz. Algumas lojas de tecidos e armarinhos, armazéns de cereais, uma escola pública e vários açougues. Repleto de peões que traziam gado para o frigorífico e gastava tudo o que tinham recebido no Bico do Pavão e com  as polacas da zona de meretrício.

Barretos no final da década de 1930. Acervo Museu "Ruy Menezes"

Na década de 1930 os principais jornais de Londres publicavam anúncios do Grupo Vestey que estaria contratando pessoas interessadas para vir trabalhar na Argentina, Uruguai e Brasil, oferecendo bom salário e muitas regalias. Entre os carregadores de carne do mercado de Smithfield os comentários eram constantes sobre a possiblidade de deixarem a Inglaterra para vir trabalhar na América do Sul. A crise econômica assolava a Europa, refletindo a situação financeira dos Estados Unidos, debilitado após a quebra da Bolsa de Valores de Nova York em 1929. Os dirigentes do Grupo preferiam contratar jovens casais, mesmo sem nenhuma experiência administrativa e com algum conhecimento de carne. Muitos dos que prestavam serviços gerais em Smithfield e em outros mercados de carne se candidatavam. Contratavam também alguns solteiros.
O Grupo Vestey em 1930 tinha 30.000 empregados em todo o mundo e estava investindo pesado na América do Sul. Tudo foi iniciado em 1912, com a compra de diversas fazendas no Brasil, principalmente no estado de São Paulo, próximas aos ramais ferroviários. A crise no mercado cafeeiro deixava os preços bem atraentes. O primeiro frigorífico foi o de Mendes, no estado do Rio de Janeiro, pela aquisição em 1916 de uma fábrica desativada de cerveja que foi transformada em abatedouro-frigorífico.
Em 1920 houve a compra de uma fábrica de extrato de carne em Fray Bentos no Uruguai, que também foi adaptada para ser um abatedouro-frigorífico e fábrica de enlatados de carne. Em 1921 houve a aquisição do frigorifico de Pelotas, no Rio Grande do Sul e em 1923 do frigorifico de Barretos. Na Argentina o Grupo chegou em 1927 adquirindo o frigorífico de Doca Sud, em Buenos Aires, na época o maior frigorífico do mundo.
Para fazer funcionar todo este gigantesco conjunto de empreendimentos, necessitava de bastante gente. Era costume de todas as empresas estrangeiras que investiam na América do Sul, contratar conterrâneos para os postos chaves de comando. Os Vesteys não eram diferentes, com poucas exceções, todos os encarregados de departamentos dos frigoríficos, contadores, gerentes de fazendas eram britânicos, ou filhos de britânicos. A seleção dos que se interessavam a deixar a Inglaterra e mudar para a América do Sul era pouco rigorosa: bastava conhecer alguma coisa sobre abate ou carne.
Casa montada, John foi para a fábrica ocupar o seu posto. Ele foi escolhido para substituir um encarregado que estava aposentando e retornaria a Inglaterra. Teria pouco mais de um mês para aprender a função. A maior dificuldade era a língua e com isso não conseguia comunicar com os subordinados. Os empregados não viam com bons olhos o novo inglesinho que aprenderia o serviço para ser chefe deles. Foi um período de dura aprendizagem, de alguma sabotagem dos empregados mais velhos e denecessidade da imposição de sua autoridade. Quando saiu o velho inglês teve que dar duro, já sabendo algumas palavras essenciais em português, passava o dia trabalhando com a turma.
Ingrid teve a assistência de outra inglesa que já vivia há mais tempo no Brasil e foi tentar suprir a despensa. Grande parte dos artigos que consumia na Inglaterra não estava disponível por aqui e foi alertada pela conterrânea que tinha que adaptar-se. Ficava a maior parte do dia sozinha em casa, chorando de saudades do pai, da mãe, dos irmãos, das amigas e até das colegas da padaria. Tinha uma moça brasileira que era sua empregada e procurava ajudá-la. Com ela aprendeu até algumas palavras em português. Como é costume britânico, as famílias só se encontravam no clube, ninguém frequentava a casa do outro. Ingrid em algumas tardes ia ao clube onde conversava formalmente com as outras inglesas. As comunicações com os familiares eram por carta. Recebia com atraso revistas da Inglaterra e de vez em quando discos e livros. Escutava a rádio BBC à noite, em uma transmissão cheia de ruídos.
John saía da fábrica todo o dia depois das 18 horas e ia para casa fazer companhia para a esposa e cansado tomava seu banho jantava e ia dormir. Convencido pelos outros colegas ingleses passava no clube onde tomava seu gim com tônica ou uma cerveja e ia embora. Com o passar do tempo teve um recaída no vício que tinha abandonado desde que saiu de Londres. Acostumou toda tarde a passar antes no bar do Clube e cada dia bebia mais. Os colegas iam embora e ele ficava bebendo e somente ia para casa embriagado. Em casa não tinha paciência para ficar ouvindo as lamentações da esposa e ocorriam desentendimentos entre eles. Algumas vezes nem tomava banho e iadireto para a cama. Esta rotina era diária. Nos domingos ia jogar críquete e começava a beber mais cedo. O casamento era uma ficção.
          Passaram-se o período de três anos e foram de férias para Londres. Terminado as férias Ingrid não quis mais voltar o Brasil. John para cumprir o contrato voltou sozinho e sua situação piorou. Bebia compulsivamente e chegava a ir para a fábrica bêbado. Perdeu a autoridade com os subordinados, passou a frequentar o Bico do Pavão e conviver com os peões e as prostitutas, provocar escândalo na comunidade e por esta razão foi advertido pela diretoria. Foi por fim demitido e obrigado a retornar para a Inglaterra.
Histórias como a de John ocorreram na vida real. A maioria dos ingleses que vieram para o Brasil eram pessoas excelentes, porém, veio também funcionários de toda espécie. Os ingleses contratados para trabalhar nas fazendas tinham pior situação. Na fábrica existiam as moradias da colônia onde várias dezenas de famílias estavam próximas, existia o Clube, as atividades sociais e esportivas. Nas fazendas muitas vezes era apenas uma família, morando distante da cidade, convivendo com gente de pouca ou nenhuma cultura, hábitos diferentes, sem rodovias e sem transporte para chegar até lá. Só o cavalo e a charrete.
Estes ingleses, embora imigrantes como tantos outros: italianos, eslavos, espanhóis e japoneses, eram diferenciados. Os outros imigrantes principalmente os latinos vinham em famílias inteiras, havendo estreita convivência entre elas. Transferiam, grosso modo, a terra deles para o Brasil, mantendo as tradições e tinham o interesse de permanecer aqui e criar raízes. Os ingleses vinham sozinhos ou apenas o casal, encontravam-se esporadicamente em reuniões sociais e esportivas, mantendo porem o distanciamento entre eles. O propósito era cumprir o contrato e voltar para a Inglaterra com algum dinheiro.


segunda-feira, 9 de julho de 2012

Os olhos não mais veem, mas o coração ainda sente


                                                                                                             Por Rossana Pacheco



                             Frigorífico (1966 - Clube)                Curitiba – (2008 - sacada de minha casa.)

Quando me ponho a pensar no Frigorífico, não o faço sozinha; trago para bem perto de mim a criança que fui um dia, pois só assim, com ela ao meu lado, minhas descrições e sensações podem fazer jus ao lugar que permanece em minha mente e coração.
Sinto que, sem a criança, a mente atual é incapaz de relatar suas lembranças, ainda mais que quem lá morou foi a criança e não a pessoa adulta que hoje lhes escreve. Eu preciso, portanto, daquela criança cochichando aos meus ouvidos, para que eu possa voltar no tempo e me ver, de novo, na avenida central, onde nasci, no dia 15 de julho de 1960, um pouco antes de a fábrica apitar ao meio-dia, conforme ocorria naquela época – e de onde saí, no final do ano de 1974, com 14 anos.
Vim ao mundo com a ajuda da parteira dona Lúcia, a mesma que ajudou no parto de meu irmão mais velho, o Agenor, e em quem minha mãe confiava plenamente. No momento de meu nascimento, estava no quarto, além da parteira e de minha mãe, minha avó paterna Izaura Marques Pacheco.
Meus avós também moraram no Frigorífico. Meu avô materno (alemão de Stuttgart), Carlos Otto Hermes, chegou ao Frigorífico na década de 1940, com sua esposa Nadir (gaúcha de Passo Fundo, tchê) e os filhos: Ione, Yolanda, Wilson e Hilde. A minha mãe foi a única a morar por quase 4 décadas no bairro, pois tanto os pais quanto os irmãos se mudaram do Frigorífico na década de 60. Meu avô trabalhou como chefe do almoxarifado, onde se aposentou e meu tio trabalhou na oficina, com o Preguinho, por alguns anos, antes de se mudar para a capital. A minha mãe e suas irmãs trabalharam, por pouco tempo, na Anglo, mas todas as três foram funcionárias da fábrica. Minha tia Ione como telefonista, minha mãe e minha tia Hilde na seção de sabonetes. Posteriormente, minha mãe foi para o laboratório, onde trabalhou junto ao Frederico Narduchi.
Quando era criança, ouvi muitas vezes minha mãe contando sobre um episódio ocorrido no Frigorífico, durante a Segunda Guerra Mundial: que alguns homens (??) exigiram que meu avô e outros alemães, residentes no Frigorífico, na década de 40, entregassem o rádio que possuíam, para que não houvesse perigo de transmitirem informações aos soldados de Hitler. Imaginem...
O meu avô paterno, Agenor Pacheco, trabalhou mais de 45 anos na Anglo. Ele se mudou de Salvador, Bahia, ainda jovem para o Frigorífico, onde conheceu minha avó Isaura (portuguesa de Trás-os-Montes), que havia, segundo ela própria, vindo ao Brasil como clandestina em um navio. Casaram-se, tiveram três filhos: Nadir, Darci e Gilson. O meu pai começou a trabalhar na Anglo com 14 anos e se aposentou aos 42 anos, tendo exercido, nos últimos anos, a função de chefe do departamento pessoal. Meu tio Gilson trabalhou cerca de 8 anos na Anglo e minha tia Darci, depois de se formar no Magistério, mudou-se para Ibitiúva, para exercer a função de professora em uma escola rural.
Até hoje me lembro da casa de minha avó Isaura, na avenida central. Adorava almoçar com eles e o menu era sempre o mesmo, mas com um gosto maravilhoso: arroz, feijão, bife acebolado, salada de alface e tomate e batatas fritas cortadas em rodelas. A casa deles era muito grande e minha avó tinha um capricho especial com as calçadas....Nunca mais vi calçadas tão brancas.  O jardim, que existia na lateral da casa e em grande parte do quintal era muito colorido e cheiroso. Mas ai se eu roubasse algumas de suas flores....era puxão de orelha na certa.
Minha infância foi mágica, pois tive o que verdadeiramente as crianças precisam: liberdade. Brincávamos de esconde-esconde nas ruas e, assim, levávamos horas para acharmos todos os escondidos. Quando ganhei minha bicicleta, uma Caloi vermelha, pude então aumentar meu tour pelo bairro. No começo, saía de casa, ia até a fábrica e depois até o final da avenida central, perto da Igreja presbiteriana. Depois, fui ganhando consentimento para ir mais longe, desde que voltasse logo. Então, um dia, fui pedalando até o campo de golfe. Entrei nas ruelas onde moravam os ingleses e meus olhos iam se enchendo de curiosidade e beleza. Sempre que podia, passava perto das casas dos ingleses e ficava imaginando as pessoas “enrolando a língua” para se comunicarem e de novo e de novo ia até pertinho do campo de golfe, o lugar que, para mim, era o mais bonito de todos.
Uma pessoa me marcou a infância, pois foi quem me inseriu no mundo da fantasia e dos sonhos: a Dona Norma, esposa do Sr. Plínio, que trabalhava no correio do bairro. Ela escolhia as peças, os textos e depois ensaiava as crianças do bairro para as apresentações em momentos especiais: dia das mães, dos pais, dia das crianças, Páscoa, Natal, etc. Assim, eu participei do baile da Cinderela, da Guerra do Vietnã, da história da Senhora Baratinha, e de outros enredos importantes.
No Frigorífico, tínhamos tudo que precisávamos: casa para morar; local de trabalho de nossos pais; escola (Grupo Escolar Fábio Junqueira Franco); clube; cinema, restaurante; armazém, igreja, etc. Se hoje, aos olhos adultos, esses lugares parecem insuficientes, aos olhos de uma criança representavam o próprio mundo.
Lembro-me, também, de alguns amigos especiais com quem brinquei: a Alba, filha da Sinhá e do Sr Neno; a Ana Isidoro; a Márcia da Direce; a Viviane (quando não brigávamos e ficávamos de mal por dias a fio...); a Míriam Marinho, a Cléia Vieira, a Rose e a Cleide, filhas do Sr Ari. A Nádia, irmã do corujinha, era com quem eu ia ao cinema. Eu passava na casa dela, pois era caminho para o cinema, e lá íamos nós duas, conversando, até entrarmos no cinema e, depois de ouvirmos aquelas músicas antigas, nos silenciávamos para assistirmos ao filme.
Tenho muitas saudades do Frigorífico e, quando me pergunto por quê, são muitas as respostas e justificativas. O desejo de voltar ao tempo é muito forte, pois se assim o fizesse, reencontraria minha família: pais e irmãos, morando todos juntos na avenida central. Meu pai e irmão caçula estariam vivos, minha mãe teria de volta sua juventude e eu, além de ser novamente criança, ainda estaria no paraíso, deliciando-me com o creme do Chico padeiro e certa de que o lobo mau não nos pegaria. Pensando, enfim, que seríamos felizes para sempre.